15/06/2012

CRITICA DE ON THE ROAD EM CANNES









Em On the road, a adaptação reverente, algumas vezes quase dolorosamente fiel à obra inovadora de Jack Kerouac, de Walter Salles, os personagens estão sempre se animando com uma coisa ou outra, e eu não me refiro apenas a drogas – apesar de que eles fumam maconha e dissolvem Benzedrine em seus cafés. Eles também vão a clubes noturnos e ouvem jazz, seus corpos tremendo e se contorcendo enquanto a música os penetra. Eles fazem muito sexo, também, a maioria disso é bem explícita (olá, classificação 17 anos!): numa corrida de carro a algum lugar, Sal (Sam Riley), o personagem de Kerouac, que ansioso porém recessivo – um menino-homem tomando cuidado com tudo o que bebe – fica pelado no banco da frente junto a Dean (Garrett Hedlund), o vivo e narcisista Neal Cassady, e Marylou (Kristen Stewart), a jovem e inocente ex-mulher de Dean, que está sentada, também pelada, entre dois homem enquanto ela os dá prazer com suas mãos. (Eu não estou brincando quando eu digo que Kristen Stewart atua muito bem nessa cena – pela primeira vez, ela parece mais entusiasmada do que desanimada.) Outro ponto forte do trabalho é a religião das palavras. Sal lê um volume de Proust, e ele digita durante a noite e anota em seu caderno, fazendo tudo que ele pode para dar forma a seu sentimento.

Uma coisa estranha sobre o filme, que se passa durante vários anos do fim dos anos 40 e início dos 50, é que mesmo observando todas essas atividades, elas são um pouco difíceis de se conectar. Música e dança selvagem, sexo desenfreado, linguagem poética: essas são todas coisas boas, mas em On the road elas são encenadas com uma sinceridade retumbante, como uma peça de museu. E então é um pouco difícil experimentar o que o filme quer dar a você. Assistindo On the road, há uma festa animada e desconexa acontecendo – e também uma grande quantidade de melancolia – que não nos sentimos tão convidados a participar, e sim a olhar, como um pedaço sagrado da antropologia cultural. E num certo sentido, isso é o que é. Salles, o talentoso e ambicioso diretor brasileiro (Diários de Motocicleta), faz tudo que pode para colocar a obra de Kerouac, que foi escrita durante apenas 1 mês em 1951 (e publicada pela Viking em 1957), bem ali na tela. O que ele não nos dá – e o que faz o livro funcionar – é o toque boêmio e deslumbrado de Kerouac. Sem isso, On the road é uma experiência curiosamente remota, com toda a razão e nenhuma rima.

A melhor coisa no filme é a performance de Garrett Hedlund, cuja fome por vida – ávida, erótica, insaciável, destrutiva – acende um fogo que irá iluminar o caminho para uma nova era. Hedlund é tão bonito quanto Brad Pitt jovem, e como Pitt, ele é um ator astuto e mutável. Ele dá a Dean olhos que brilham com um entusiasmo sedutor que beira o sofrimento. Dean ricocheteia entre a estrada que ele toma com Sal e Marylou e sua vida apertada como marido e pai em San Francisco com sua mulher, Camille (Kirsten Dunst). Um traficante quando precisa de dinheiro, ele passa por cima dos limites da vida da classe média porque ele não liga para eles, ou mesmo vê-los. Ele é todo “agora, agora, agora”, sua paixão transbordando, mas seus sentimentos não são apenas sexuais. Eles são sobre seu amor por seus amigos, como Sal ou Carlo, o personagem de Allen Ginsberg, interpretado por Tom Sturridge com uma doçura de menino do pós-guerra em New York.

Kristen Stewart, muitas vezes sem blusa, faz uma convincente hippie, obscura e inocente Marylou, e Viggo Mortensen no papel de Old Bull Lee, um viciado que já está mergulhado em violência e paranóia. Sal, infelizmente, é um daqueles heróis de filmes que é um atento observador, e Sam Riley, o ator britânico que foi fascinante como o líder do Joy Division Ian Curtis no filme Control de 2007, não consegue o tornar interessante. Em On the road, Riley é mais como um Leonardo DiCaprio instropectivo, com elegância e inocuidade. Ele interpreta Sal como um cara que pode fazer várias coisas, mas ele acaba nunca tomando as rédeas – da vida ou do filme.

No livro de Kerouac, é claro, Sal não tinha que tomar as rédeas. Sua voz estava lá em cada palavra que Kerouac escreveu. Sem essa voz (nós a ouvimos, é claro, mas não é como um filme – é como se tivesse sido lido), On the road é um drama de encontros e relacionamentos que duram por anos e ainda tem toda a informidade inebriante de vinho caindo do copo. Mas agora, sessenta anos depois, em On the road, enquanto o filme talvez tente te mostrar como era antes, você não consegue imaginar.

Fonte TRADUÇÃO E VIA: kristenstewart.com.br

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